31 de março de 2008

"Os direitos dos alunos, consagrados no respectivo estatuto, são os mais abrangentes e absurdos que se possa imaginar "
António Barreto, Público, 30 de Março de 2008

29 de março de 2008


Sou membro fundador da Associação Cívica "Movimento Esperança Portugal", que vai tornar-se um partido político. Saiba mais sobre o MEP e ajude a recolhar assinaturas necessárias para a constituição do partido político (folha de assinaturas). Pode assinar qualquer pessoa qu seja maior de idade e esteja recenseada, excepto militares e polícias no activo.
Leia a entevista que dei à Rádio Aveiro FM e ao Jornal Diário de Aveiro.

17 de março de 2008

Na Linha Da Utopia


Chiara Lubich, a vida ecuménica
1. Era o tempo da II Guerra Mundial. A jovem Chiara Lubich, natural de Trento (Itália), vendo a dramática situação da Europa na decadência dos ideais humanos, vem propor uma mensagem de esperança e de diálogo, assente na condição de abertura do ser humano ao ser dos outros e ao ser de Deus. Chiara recebe agora, na hora da partida (14 de Março 2008), os frutos da sua sementeira plantada ao longo da intensa vida (de 88 anos) dedicada a anunciar caminhos de UNIDADE. Não é só o mundo ecuménico das igrejas que está reconhecido e vive a sentida hora da despedida quando (terça, às 15h) em Roma o mundo celebra o dom de sua vida. João Paulo II acolheu e apreciou a sua obra, dizendo que ela corresponde na essência ao espírito renovador do Vaticano II.
2. Chiara Lubich (1920-2008), fundadora do Movimento Ecuménico dos Focolares (www.focolares.com), do seu coração universal transborda um testemunho de vida que interessa a todos. Não foi por acaso que a sua raiz fraterna da mensagem «que todos sejam um» espelha pelo mundo fora frutos de unidade nas múltiplas vertentes do diálogo (quatro): entre católicos, entre cristãos das várias confissões, com membros de outras religiões e com pessoas de visões não religiosas. Uma verdadeira catolicidade (universalidade) que hoje torna presente a sua obra em 182 nações (também em Portugal), num universo de pertença de cerca de 140 mil focolarinos activos e na ordem de dois milhões de aderentes.
3. Enraizada na essência da mensagem cristã, como visão aperfeiçoada da “fraternidade” (emblema ideológico que a Revolução Francesa de 1789 havia desvirtuado cabalmente quando se observam os factos sucedâneos da exclusão de género e de raça), o mundo não esquecerá que ela foi a primeira mulher a partilhar a sua experiência de vida e de fé em auditórios de diferentes religiões como entre muçulmanos, hindus e budistas. A sua mensagem, como afinal as grandes mensagens, não se esgota no campo da religião mas abre-se a uma totalidade de experiência humana fraterna. Neste contexto de uma vida vivida ao serviço dedicado do bem comum estão concepções que iluminam as sociologias e as economias, propondo mesmo conceitos como a «economia de comunhão».
4. Factos muito relativos e mesmo secundários para ela como para as pessoas grandes porque simples, mas elementos identificadores do reconhecimento dos alcances da vida e obra de Chiara Lubic na sociedade civil, estará o facto dela ter sido aclamada por variadas universidades de todo o mundo com o título de honoris causa. Em áreas tão díspares como a teologia, psicologia, filosofia, economia, sociologia, política. Parte da história humana para uma história sem tempo e espaço mais um símbolo das lutas e das esperanças do passado Séc. XX. A semente caiu na boa terra e deu largos frutos! Acreditamos eles vão permanecer porque anteciparam futuros de unidade humana nas diversidades do tempo global. Mas, que não se percam esses ideais abertos, temos de compreender e sensibilizar mais para a raiz profunda que moveu a vida de gente tão generosa como Chiara Lubich. O mundo está reconhecido e quer continuar a aprender da dádiva que a inspirou em tempos conturbados como os seus.

Alexandre Cruz [17.03.2008]

Na Linha Da Utopia


Uma canção para “Ser Tempo”
1. Vivemos esta semana um tempo especial. Desde a antiguidade cristã que, na aproximação à Páscoa, na semana antecedente, se procura interiorizar de forma mais plena o centro da mensagem da revelação do Absoluto de Deus na forma personalizada, numa Pessoa chamada “Jesus Cristo”. Todas as comunidades que cultivam valores com raiz de esperança alicerçada no divino têm os seus “tempos fortes”. Para a comunidade cristã vive-se a designada “Semana Santa”; uma semana que começa com a celebração festiva do Dia Mundial da Juventude (DMJ), uma iniciativa de João Paulo II comemorada no domingo de Ramos anterior à Páscoa. Na diocese de Aveiro este ano foi escolhido o (arciprestado) Concelho de Anadia para acolher a multidão de jovens da área diocesana. Mil, dois mil jovens… o importante é sempre a vivência de cada um no sentido dos valores comunitários de uma esperança que se quer fortalecer em ambiente pré-pascal. E ficam sementes de paz para a vida!
2. Também, periodicamente, vão surgindo propostas e iniciativas de partilha através da música, esta uma arte de apurada sensibilização para a juventude. Da organização do Secretariado Diocesano da Pastoral Juvenil, como todos os anos e no quadro da proposta diocesana para a juventude, este ano na véspera do DMJ realizou-se o Festival da Canção. Em noite de tantas e ricas mensagens, coube à Paróquia de Aradas, pelo seu grupo de Jovens e numa caminhada permanente de juventude como em todas as paróquias da diocese, a construção da mensagem mais reconhecida pelo júri do festival (melhor letra e canção vencedora). Abaixo partilhamos esta mensagem que vai abrindo a ponte pascal: SER TEMPO!

Fui procurar…onde se esconde o tempo
Saber como faz p’ra não parar
É que saber uns truques dava jeito
Para poder levar-te e ensinar-te…
Mesmo a dormir!

Não o encontrei e o tempo não parou
Não sei onde falhei, o que me escapou
Eu só queria aprender a ser mais eu
E a toda a hora e a todo o momento
Saber estar em ti…

Também eu quero ser tempo
P’ra nunca parar
Ser a tua voz no vento
E poder renascer em ti
Ser o que queres anunciar

O tempo é da gente, o tempo somos nós
O tempo é a correr e a vida é uma só
Porque me falas a mim isso eu não sei
Só sei que quero ser…sei que quero viver
P’ra ser a tua voz!

O que seria de nós, sem o espírito divino?
E o que seria do mundo sem um olhar de Paz!
[ARADAS: Letra e música: Daniel Lopes. Interpretação: Daniel Lopes, Liliana Monteiro, Paulo Gravato, Tiago Marinho.]

Alexandre Cruz [16.03.08]

MEP - Rui Marques no Diga Lá Excelência (Parte 1)

Veja a entrevista do Rui Marques ao programa «Diga lá excelência» da RTP2, Renascença e Público sobre a criação de um novo partido, o Movimento Esperança Portugal.
Para quem estviver no distrito de Aveiro e quiser aderir ou apoiar, quer na recolha de assinaturas, quer noutras actividades, contacte-me por favor para para o e-mail: angeloferreira2005@gmail.com.

Portugal precisa cada vez mais dos seus cidadãos, das suas pessoas que não se revêem no actual estado de coisas.
Faça parte deste movimento!

13 de março de 2008

Na Linha Da Utopia

Educar “em” Direitos Humanos
1. A Comissão de Solidariedade Social da Associação Académica da Universidade de Aveiro (ORIGAMI), na sua organização do Ciclo de Tertúlias para a Tolerância, levou nestes dias a efeito importante iniciativa sobre «Educação para os Direitos Humanos». Um apelo e um convite fundamental aos estudantes na reflexão continuada sobre as preocupações do mundo em geral (em que continuam a ser tantas as violações dos direitos humanos); mas numa dinâmica da “transferência” dessas preocupações globais para as visões do compromisso diário no âmbito do estudo, investigação e trabalho. A dinamização esteve a cargo da Amnistia Internacional, instância de referência no zelo e promoção dos direitos humanos e na denúncia de situações de seu desumano incumprimento. Conhecer “o que falta” é sempre o primeiro passo para que não falte; a este nível a Amnistia Internacional transfere o “grito” de situações silenciadas para a visibilidade global. Um impulso decisivo em ordem à dignificação da pessoa humana no mundo actual.
2. Felizmente que hoje são muitas as sensibilidades nesta área, no esforço de proporcionar o encontro do «ideal comum a atingir por todos os povos» com às práticas concretas, em todo o tempo e lugar. São também muitas e diversificadas as instâncias e organizações que vivem e promovem esta causa de todos. Também se sublinhe que, hoje, falarmos correntemente de «educação para os direitos humanos» já é por si um sinal de conseguida e múltipla abertura; tanto da educação como tarefa abrangente e por isso que estabelece ponte com as realidades a transformar, como do referencial da Declaração Universal dos Direitos Humanos que quer chegar a todas as áreas do conhecimento (mesmo técnico-científico) para que ele seja e esteja, sempre mais, ao serviço da Humanidade. Este horizonte de diálogo transdisciplinar é, afinal, o caminho que corresponde a concepção plural e inclusiva da dignidade da pessoa humana.
3. Pese, embora, os caminhos já percorridos como eco histórico do dia «10 de Dezembro de 1948» (em que simbolicamente estamos), uma consciência mais efectiva e participada, motivada e sensibilizada está sempre em reconstrução. Enquanto o desejado desenvolvimento humano dos povos continuar a escrever páginas de sangue e indignidade este quadro de referência sócio-educativo não pode esperar. Talvez, nos tempos em que estamos, onde convivemos todos os dias as notícias da miserabilidade correndo o perigo de nos habituarmos, nestes contextos, a aposta decisiva será mesmo na qualidade da proposta como educação «em» direitos humanos, onde estamos totalmente envolvidos naquilo que comunicamos. Felizmente que hoje uma multidão vive este caminho e dá por ele a vida, o tempo, a esperança. Mas ainda falta sempre tanto para este ideal descer ao coração de cada um, e, talvez até mesmo na educação, a começar pelo filme dos brinquedos para crianças (muitos carregados de “guerra”)! O “refrão” dos “direitos humanos”, por si, tem vida curta; para ir mais longe precisa de incluir a “dignidade humana” na sua raiz aberta à Totalidade que cultive e aprecie o que é SER e existir no mundo com os outros. O caminho longo da dignidade!
AC [14.3.8]

12 de março de 2008

Na Linha Da Utopia


Memória e vida, para que seja Páscoa
1. Muitas vezes ouvimos gente adulta e influente nas sociedades a recordar com nostalgia os tempos idos em que as festividades mobilizavam os lugares, as ruas e as famílias em torno de valores esperançosos e em ordem à renovação de ideais e princípios estimulantes ao bem comum. Naturalmente os tempos são outros, e importará nem ter uma saudade como se antigamente fosse tudo bom, nem simplesmente esquecer o passado como se esse nas suas tradições não tivesse razão de ser. Talvez este seja um dos eixos da encruzilhada da civilização actual, onde se procura dar um “salto em frente” de tal maneira amplo que acabamos por não saber em que se alicerça a própria vida; em contrapartida, verifica-se essa memória gratificante (hoje) das memórias do passado, considerando-se o quanto elas nos constroem na nossa própria identidade. Mas neste contexto a maior interpelação é sentir a completa indiferença de quem tem essas memórias e não vive qualquer preocupação em “passar” um certo testemunho aos seus vindouros, até na preocupação cultural de que vão apreendendo “sentido”em todo o património (e muito dele é religioso) que os rodeia.
2. Não admira, por isso, a dificuldade em fazer passar a mensagem da cultura, da vida e da espiritualidade. Até da própria dimensão pessoal mais básica (diríamos) aconfessional, humana, sem ligação a qualquer igreja ou religião, pois a “menoridade cultural” ou o preconceito ideológico ou, ainda, muito do peso institucional das religiões e igrejas, afastam o ser humano contemporâneo da sua caminhada existencial mais profunda. Ninguém dá o que não tem. E é certo que para ler e partilhar toda a panóplia de significados que as festividades e celebrações comportam como “história viva” e actual é preciso um grande caminho de busca de sentido. A Páscoa (passagem) de há cerca de três milénios para cá, e numa dinâmica aperfeiçoada pessoalmente há 2000 anos, inscreve-se nesta mesma fronteira. Quem a conhece “por dentro” vê nela o centro de referência no qual alicerçar um sentido a dar à vida; quem a lê no imaginário público sente um resto interessante de tradição curiosa com sentido sociabilizante; quem não a conhece, não quer conhecer e não quer que ela se partilhe (esquecendo que dela derivam mesmo os valores sócio-democráticos da tradição judeo-cristã) então vai mesmo procurando apagar da memória colectiva as centelhas da sementeira de significado e sentido…
3. É o tempo das opções, entre um “Algo/Alguém” que nos estimule positivamente ou um “quase-nada” de ausência de fundamentação do sentido da vida. Neste erguer-se-á o “ter”. Até como significado cultural (se já não na essencialidade altíssima do que a Páscoa é enquanto fonte de “vida nova”) torna-se essencial o compreender a memória histórica (e seus valores) que nos precedeu. Será isto importante? Que memória queremos que perdure no coração nos nossos filhos? Serão só as coisas da Páscoa?

Alexandre Cruz [12.03.2008]

Na Linha Da Utopia


A ética do “tempo” em educação
1. É verdade que muitas das realidades da vida podem ter soluções rápidas e pragmáticas. Assim esta visão instrumental, normalmente, se aplica a uma obra a realizar, uma ponte a construir, um jardim a tratar. Obras relativamente fáceis! Também é certo que muitas soluções hoje têm a matriz tecnológica e informática, numa aceleração eficaz de processos que procura aliar rigor e qualidade que se difundam rapidamente. Mas não podemos correr o perigo de querer transferir aquilo que são processos da ordem técnica e prática para uma grande multidão, pois no “meio”, naturalmente, há sempre muito ruído que obriga o ritmo a ser outro se se quer chegar a bom porto. Faz lembrar coisas tão simples e tão práticas como uma “pista de escuteiros” em que o tempo que leva um preparador a percorrer esse caminho é multiplicado por três na experiência de grupo; ou então diante de uma assembleia de 1000 pessoas a organizar uma iniciativa comum teremos de repetir diferenciada e metodicamente várias vezes as mesmas ideias a ver se fica “tudo em todos” e mesmo assim…! Teremos de redescobrir mais o realismo e a organização do tempo “qb”, como assimilação e sabedoria consistentes, naquilo que querem ser, efectivamente, os projectos comuns.
2. Sendo-se sempre contra todo o imobilismo que paralisa as fundamentais e necessárias renovações, o certo é que o fulgor das “pressas” unilaterais nas reformas, do olhar em frente esquecendo os “lados” que afinal são as bases de sustentabilidade estrutural, esta prática sempre trouxe consigo grandes anticorpos. Tantas vezes a falta de consciência efectiva da realidade de decisores ou a proclamação de decisões a um ritmo inassimilável por quem está no terreno concreto, este facto, coloca-nos diante de dilemas que dividem o que existe de seguro e bom e multiplica a desagregação e instabilidade. Muitos portugueses têm sido autores e vítimas tanto de seu imobilismo como, talvez mais ainda, dos “repentismos” entusiastas da gestão da “coisa” e causa pública. O tempo do dia-a-dia precisa dessa motivação redistribuída harmoniosamente, evitando dessa forma, quanto possível, os solavancos das emoções.
3. Particularmente, nesta problemática, nada nos interessa (politicamente) quem recua, quem avança, quem ganha e quem perde. Um perdedor está garantido: a comunidade e, no fundo, o país. Claro que os discursos vão “torcendo” o que podem para assumir a “gradualidade” no tempo como factor humano; tudo porque tal como não se pode querer um oceano num rio, não será ético pedir às escolas o “repentino” que áreas tão abrangentes como a educação (o ensino, as famílias, os estudantes, as comunidades locais) não podem dar. Educar nunca foi nem será acto instrumental; se fosse seria bem mais fácil mas menos determinante no desenvolvimento dos povos. (Ofereciam-se tecnologias e pronto…!) Os tempos de recuo estratégico que se seguem (chame-se outro nome!) demonstrarão que houve tempo perdido em não compreendermos a grandeza, abrangência e complexidade de tudo o que está em jogo. Um refrão destes dias tem sido que há muitas instituições do país especializadas em Educação e que não foram chamados a construir (n)este processo. Há reflexões e lições educativas de fundo a serem tiradas de tudo o que acontece(u)… Seria um passo de coragem(?!).
AC [11.3.8]

Na Linha Da Utopia


Sarkozy, o feliz e a liderança
1. A popularidade está a cair a pique. Para os franceses desejosos do retorno da França à liderança europeia, o apaixonado Sarkozy faz hoje com que se coloque a pergunta: «Este homem pode ser o presidente da França?» São sondagens, inquéritos, comentários de opinião em torno desta questão após a simbólica “derrota” eleitoral destes dias. A promessa de “Sarko” foi a nova “revolução”. No quadro prévio das sempre naturais insatisfações político-sociais, um designado “efeito Sarkozy” conseguiu convencer a sociedade desejosa de um “dom Sebastião” à francesa. Os franceses acederam, acreditaram nessa promessa. Não estavam era a contar que o presidente fosse tão rápido a passar das promessas eleitorais a um centrar da vida presidencial na sua vida pessoal. Os jornais vão atribuindo os títulos: «Sarkozy, a política sou eu». Começou por ser omnipresente em meia dúzia de assuntos com visibilidade social e libertadora, visando reconciliar uma França credível com a Europa. Diante do pensamento historicamente clássico francês, rapidamente a sua presidência passou a estar centrada na esfera «comportamental». Uma nova revolução; diríamos, (r)evolução a mais para um povo que também aguarda quem restitua a ordem da dignidade política.
2. Em escassos meses o presidente francês foi criando modas e manifestando uma «felicidade» extraordinária. De sua afirmação diz que pode ser-se Presidente da República e ser-se feliz ao mesmo tempo; como ele diz: «Eu sou feliz». Sobre a sua relação com Carla Bruni, do seu gabinete diz-se que «ele embriagou-se de felicidade no momento em que os franceses a perdiam» (Público, 9 de Março). Pretendendo reinventar a França para o século XXI, inicia por recriar a própria imagem de presidente, dessacralizando, sendo tão igual aos franceses que acaba por provocar admiração e «choque». No contexto dos resultados eleitorais do último fim-de-semana, não tanto as políticas mas o político parecem incomodar os franceses. Uns chamam-lhe «vulgar» (comum), outros que seu comportamento é «imaturo», outros, os psicólogos, ainda, que é «narcísico». Diz-se também que alia traços de grande coragem e intuição mas simultaneamente de «egolatria e de uma vaidade sem limites». Panorama complicado para o presidente em que os franceses acreditaram. E ainda agora estamos no princípio da nova felicidade do presidente, chamado há alguns meses de «hiper-presidente». Um nosso professor dizia que quanto maior é a subida, maior é a queda. Até onde chegará o líder Sarkozy e a sua felicidade?
Alexandre Cruz [10.03.2008]

Na Linha Da Utopia


A Faixa de Gaza
1. Há pedaços de terra que estão cheios de sangue. Não só da história passada, mas das histórias que se continuam a escrever no presente. E Deus não tem nada a ver com isso. Os homens é que O “usam” como argumento para atingir os seus fins de domínio sobre “o outro”. Os últimos quatro mil anos da história das terras chamadas israelo-árabes espelham, de forma emblemática, esse desconcerto e desentendimento humano, em que a cada século que passa vão-se juntando mais páginas de conflitos, ao que parece, intermináveis. Claro que, de relance, somos pequenos para compreender tanta informação, tantos dados em jogo, tantos cruzamentos de raças, religiões, espaços, locais, sinagogas, mesquitas, igrejas, sentimentos, emoções, razões, cegueiras, justiças, injustiças, verdades, fanatismos… em que cada palmo de terra condensa a luta de uma vida e de muitas vidas. Repetimos, Deus (que é Amor) não tem nada a ver com isto. Ele até tantas vezes sublinhou e reafirma que o único “lugar físico” que “quer” é o “coração” humano, a consciência-ser, «em espírito e verdade».
2. Não compreendendo isso, poderemos nesta geração correr o perigo ignorante de atribuir às religiões e a Deus aquilo que é pura e unicamente obra interesseira e dominadora dos homens, o que resulta que se chame “terra santa” a uma terra nada santa nas incompatibilidades de tanta história em que só mesmo pelo “perdão da memória”, como tanto falava João Paulo II, é que lá iremos ao caminho da paz. A triste história continua e hoje as ONG’s que estão no terreno vêm dizer que se vive na Faixa de Gaza o pior período de crise humanitária desde a guerra de 1967. As culpas da desgraça, “taco a taco” tal como a guerra, vão-se atribuindo reciprocamente entre Israel e o Hamas… No passado recente as razões são que, após os disparos de rockets pelo Hamas em Janeiro, Israel impôs o actual bloqueio a Gaza na data de 17 de Janeiro e raids aéreos frequentes têm feito dezenas de mortos na famosa Faixa de Gaza. Do “bloqueio” de quase-tudo o essencial à vida diária vem um relatório das ONG’s de cenário dramático intitulado «Faixa de Gaza: uma implosão humanitária».
3. Os Estados Unidos, na fronteira da cena internacional e das imagens perturbadoras que vão chegando, pedem um “alívio” do bloqueio para garantir as condições de humanidade. O quarteto de negociadores (Estados Unidos, União Europeia, Rússia e Nações Unidas) vai avançando na gestão da mediação do cenário político. As ONG’s no terreno vêem-se e desdenham-se para socorrer não havendo condições de luz eléctrica para fazer intervenções clínicas, água potável para matar a sede, esgotos a irem para o mar, corte de comunicações, tratando-se de uma população bloqueada em que mais de 1,1 milhões dependem da ajuda alimentar. Alguns analistas vão falando de “genocídio”. Os céus de Gaza respiram a pólvora, ar poluído que, independentemente das políticas ou dos grupos atiçados de fanatismo político e/ou religioso, vai mostrando a limitada incapacidade humana. Se a história de séculos o confirma, a história presente continua esse caminho. Nada de novo, porque tudo velho. Nenhuma das razões justifica o injustificável desumano que persiste. Ao menos não sofram as populações. Precisamos de aprofundar o diálogo de civilizações para compreender a história e propor uma nova memória de paz. Ou seguir-se-á indefinidamente a contra-ofensiva?
Alexandre Cruz [09.03.2008]

NA LINHA DA UTOPIA

Uma mesa comum: «E os alunos?»

1. O que temos verificado no panorama da educação suscita muitas reflexões por este país fora, umas silenciadas outras expressas. Educação, área estruturante e delicada, trabalhada esforçadamente nas últimas décadas por gerações de líderes, professores e famílias, estudantes e entidades. Muitas propostas ou indicativos estimulantes que hoje se consideram pertinentes já são pensados há muitos anos por quem foi abrindo caminhos de uma educação inclusiva e participada pela sociedade a quem, afinal, se destinam os educadores. Da outra face da moeda, muitos défices e limites do “sistema” têm merecido os reparos denunciadores de um consenso na razoabilidade que tarda em chegar. Sem alarmismos, mas sem superficialidades, estas últimas semanas têm sido más demais para ser verdade. Quase um beco sem saída; radicalizaram-se as posições em sector tão fundamental (e alimentador) de uma desejada vida social tolerante, compreensível e comprometida com o essencial da tarefa educativa: os estudantes.
2. Numa simples opinião, talvez ao ponto onde chegámos seja necessária mesmo uma “terceira via”: uma “mesa” onde se recentre o essencial e onde não se sentem as inflexibilidades dos dois lados, mas sim os dois ângulos da questão. Venha e cultive-se uma mentalidade sócio-educativa (o “trunfo” dos países desenvolvidos) onde não adianta nada (1º) nem demitir ministros da Educação, (2º) mas onde estes nas políticas que representam saibam construir uma via comum. As inflexibilidades e intolerâncias não conduzem por nenhum caminho, a não ser o pior. A fronteira é ténue, ou já foi mesmo ultrapassada. Quanto mais as versões político-partidárias avançam com as bandeiras dos gritos e das demissões ministeriais (seja de que lado for), mais difícil se tornará a comunidade escolar, a sala de aula, o recreio, o envolvimento dos pais, das autarquias. Para descer basta um instante, para subir a qualidade são necessários anos. Também aqui a noção de reformas que temos carece de uma sustentabilidade que inclua, à priori, a globalidade das expressões.
3. Reformas (como as revoluções) à força, não só no “momento seguinte”, mas, como vemos, “durante”, resulta no panorama caótico impensável. As noitadas dos professores nas ruas do país têm sido estonteantes, no que se diz e no cansaço que gera para ao fim de horas ‘dar aulas’; a “revisão” (natural em processos democráticos) do processo de avaliação de professores tarda demasiadamente, como se fosse algo supra-dogmático. Queremos buscar razões para a “confiança”, mas, pelo “tesouro” da educação que (não) vemos, só abundam cogumelos desagregadores. Talvez tenhamos de começar do princípio e criar um slogam no ser profundo de cada cidadão: precisamos de nos sentar a uma mesa comum e reflectir sobre «E os alunos?». Não sabendo para onde vamos, sabemos que será pelo que temos visto. Claro, é preciso grandeza de Humanidade para reconhecer que aqui ou ali todos falhámos e queremos melhorar, sem que isso tenha de significar o “atirar pedras” demissionárias. Para quando esta grandeza humana? Conseguiremos mudar esta matriz infeliz da nossa história? Até quando?!
Alexandre Cruz [06.03.2008]

Na Linha Da Utopia

As duas gerações

1. Nas comemorações dos 18 anos de edições, o jornal Público elabora um interessante exercício de ver como estávamos há 18 anos, no confronto contemporâneo dos que nasciam com os que na altura atingiam essa idade. Dos que nasciam no ano do Público (1990) aos que chegavam a considerada maioridade de 18 anos já parece haver uma distância tal como se se tratasse de muitas décadas de diferença. Ajuda-nos este confronto a tomar consciência que desse tempo para hoje as velocidades com que comunicamos aproximaram o particular do universal e o mundo da casa e vida de cada um. Nascendo, em 1989, com a queda do Muro de Berlim uma nova configuração planetária (com o fim do último totalitarismo, soviético), no mundo da época respirava-se de alívio pós-guerra fria na expectativa realizadora e esperançosa de uma verdadeira pacificação global.
2. Nesta nova conjuntura de liberdades abertas (não há liberdades fechadas!), talvez os anos 90 tenham sido a época histórica de uma autêntica “epopeia tecnológica”, com o boom eufórico da universalização das múltiplas formas de comunicar e sentir o mundo presente. Este mega exercitar da globalização, de tendências marcadamente hegemónicas e de domínio do económico em detrimento das diversidades, das ideias, políticas e culturas, sofre um forte revés nos atentados do 11 de Setembro de 2001. Talvez tudo tenha andado depressa demais em termos de tecnologias e de aproximação estratégico-científica e comunicacional, porque talvez tudo tenha andado devagar demais no que se refere ao verdadeiro (re)conhecimento da essência da Humanidade nas suas diversidades e nos seus “porquês”. O incompreensível “grito” do 11 de Setembro traz consigo um arrepiar de caminhos que, nas inseguranças e nos medos, pode reconduzir a história a alguns fechamentos geradores de desigualdade e exclusão.
3. A geração portuguesa que nasceu há 18 anos vive hoje com as mãos cheias de tecnologia mas, não tendo assistido ao seu emergir (algo que quem na altura tinha essa idade foi presenciando), corre o perigo crescente da absolutização das “coisas” deitando a perder o essencial da humanidade pessoal e social que são as relações humanas. Os resultados estão aí: Como refere o estudo do Público: «Acreditam: neles…» e «Não acreditam: no país, no casamento, nos outros». Num país diferente para melhor em muitas realidades mas na mesma em relação a muitas desconfianças espelhadas em mega casos de justiça e a sua continuada incerteza, a geração que está aí confirma os receios de uma (pseudo-)cidadania da indiferença sócio-política que, de quando em quando, costumamos criticar... Talvez tenhamos muito a aprender com as gerações anteriores; mas para isso é preciso o “diálogo de gerações” e mesmo o diálogo intercultural. Nestes diálogos, é certo que usando todas as virtualidades que nos aproximam, mas… preservemos e enalteçamos a presença humana.

Alexandre Cruz [05.03.2008]

Na Linha Da Utopia


Vencer o Pessimismo
1. Não se pense que é só em Portugal que o pessimismo vai alastrando, nem se julgue que o factor de crise económica é o ‘cerne’ da questão e a sua raiz. Talvez as ondas das emoções sociais sejam como as bolsas de valores, depois de fases de optimismos em que tudo parece correr às mil maravilhas (dos anos 60-70) vem a crise do reequilíbrio e reajustamento à realidade (em fins e início de milénio). Sublinhe-se, um certo sentir («difuso» ou infuso) de pessimismo só pode ser superado com o compromisso de cada dia, não havendo fórmulas mágicas que solucionem todas as questões em simultâneo na sociedade, hoje, em rede. Normalmente, neste lado do mundo em que nos fomos habituando a uma certa qualidade de vida, só queremos que a “rede” funcione para as coisas positivas, esquecendo que não há bela sem senão e que, talvez, os múltiplos processos de globalização em curso são a origem das novas sensações a reconhecer e integrar.
2. Como em tudo, o primeiro passo é “compreender”. Por isso, não admira que lendo as transformações em andamento, em que por exemplo o emprego para toda a vida é realidade já mesmo do passado, diante das novas inseguranças, a resposta humana não pode ser a resistência da luta contra os moinhos de vento das transformações; a tensão da resposta terá de se projectar no encarar, formar, lutar, procurar, espevitar a esperança na redescoberta dos mecanismos de vida dinâmica, onde a pessoa é, efectivamente, parte das soluções que ela sabe (eticamente) criar e reinventar. Ficar parado, desmotivado, resignado, a ver o mundo passar e perder tempo queixando-se na contínua ‘lamúria’, será afogar-se num pessimismo doentio que nos diz que se vivêssemos em outros séculos ou noutros sofridos continentes da actualidade já há muito teríamos padecido. Talvez na raiz do pessimismo também esteja uma mentalidade de impossíveis expectativas em relação à vida, confundindo muitas vezes (como há tempos dizia D. José Policarpo) felicidade com facilidade.
3. Muitas gerações que nos precederam tinham muito menos para viver. É natural que os tempos são outros, mas muitas vezes os hábitos da fartura (e fartura mal gerida, como o comprovam muitos supérfluos e mesmo o grave problema da hiper-obesidade de muitas crianças) acabam por deixar uma sementeira mais do “deixa andar” do que da palavra de ordem “vamos lá!” É claro que não se podem ocultar os cenários realistas (complicados) que vivemos, estes espelhados em variados relatórios que sempre surgem; mas toda a aposta na mentalidade terá de ser de investimento em ideias, esperança, cultura, formação, valores, ética, compromisso, cidadania, envolvimento (as palavras poderiam não acabar). No fundo, a diferença entre o pessimismo e o optimismo está no património de referências do coração humano... Quem dá valor às pequenas coisas só tem razões para agradecer o dom da vida e redescobrir energias do compromisso diário. Multipliquemos uma confiança realista (esta que não se confunde com muito do optimismo fácil proclamado pelos poderes), sem esquecer as dificuldades, mas não permanecendo nelas; faz mal, até à saúde (pessoal e social) e desmobiliza a reacção em ordem ao compromisso diário.
AC[04.03.08]

Na Linha Da Utopia


A bondade de coração
1. As encruzilhadas do passado séc. XX fizeram chegar até nós ecos de gente cuja bondade permitiu a redescoberta da esperança em caminhos tão tortuosos. Aqueles que, colocando as armas de lado, foram obreiros das “revoluções pela não-violência” deixaram atrás de rastos de luminosidade que, enquanto houver memória humana, hão-de perdurar no que de melhor a humanidade é capaz. É que diante das guerras e intolerâncias responder com as “armas” da paz é atitude que só pode provir de corações grandes, daqueles que sabem que podem perder uma ou outra “batalha” (das coisas) mas na certeza de que ganham definitivamente a “guerra” (dos valores de consciência com futuro). Podemos, entre tantos outros, lembrar os emblemáticos Luther King e Mahatma Gandhi nas suas lutas pela dignidade humana em que não responderam com as mesmas moedas de que foram vítimas.
2. A crispação de algum do inseguro tempo presente está a fazer vir ao de cima a antiga “lei de talião”, quando na menoridade existencial e social, se respondia “olho por olho, dente por dente”. Uma verificada intolerância (e mesmo o seu ridicularizar) para com as legítimas e dignas diferenças, ou um autismo superficial de poderes que cega a compreensão da complexa realidade, estão a proliferar como cogumelos. Tudo quase que numa resposta “taco a taco” como se, definitivamente, uma certa bondade humana estivesse já fora da validade. No plano da constatação, há dias no parlamento, alguém de opinião diária em grande órgão de comunicação manifestava a profunda tristeza com as actuais formas de “fazer política” (espelhadas no debate entre Sócrates e Portas); dos dois lados da intriga, uma “guerra” demonstrativa de como vamos andando… Todos falam do interesse nacional, mas a preferência prática continua na quezília...
3. Talvez fosse interessante e importante o conhecer, estudar, reconhecer e compreender mais e melhor a vida daqueles que nos precederam da vida e que foram abrindo caminhos de dignidade humana e de coesão social. Esses foram criadores de “pontes” com os tijolos que outros antes haviam usado para erguer os “muros” da divisão. Se não cuidarmos deste património essencial da humanidade, apre(e)ndendo da grandeza e da bondade generosa desses profetas, sem darmos por isso, podemos ir desumanizando a vida e as relações… Em muito das nossas sociedades, a montante, já quase custa a compreender que terão de existir valores e princípios inalienáveis; mas, simultaneamente, diante de todas as inseguranças, a jusante, reclama-se a criminalização de quase tudo o que for o passar da fronteira. À crispação e à desagregação terá de se responder com a bondade, o mesmo é dizer, com “sabedoria”. Esta, que é sempre o futuro, não segue os números ou as fórmulas pois “persegue” a pessoa toda e tudo o que existe, mesmo sem ver.

Alexandre Cruz [03.03.2008]

Na Linha Da Utopia

Estudar as claques de futebol
1. O que são as grandes claques de futebol? Como vivem e de que vivem? Que rituais e palavras geram essa unidade quase inquebrantável? Que energias da claque transitam para a vida pública? Como procuram ou conseguem lidar os clubes como essa força poderosa, na emoção capaz do melhor e do pior? O que acrescentam ao futebol? Serão mesmo necessárias? E quando tudo corre mal, quem se responsabiliza? Têm tendência a crescer à medida que as desigualdades sociais aumentam? Haverá alguma relação entre a exclusão social e as grandes claques de futebol? Como vêm a equipa adversária e as claques do outro clube? Que linguagens, chavões, gritos predominam? Haverá ritos de iniciação e hábitos de continuação para a pertença? Como se comportam na vitória? E que dizem e como agem-actuam na derrota? Enquadram-se no tipo de relação “amor-ódio”? Será obrigatório beber cerveja?!...
2. As perguntas poderiam nunca mais acabar. Volta e meia o assunto das claques salta para a praça pública. Normalmente pelos motivos menos felizes. Passado uns dias e arrefecendo as circunstâncias, como em tudo, volta-se ao dia-a-dia e as claques vão fazendo o seu percurso ritual, habitual. Quando se aproximam os grandes jogos, nacionais ou internacionais, falam-se de centenas e centenas de polícias, quase que diríamos a escoltar para “dominar as feras”, não vão elas soltar-se e “partir tudo”. Estranho mundo esse das claques, onde muita gente se deve perguntar, afinal, como subsistem na sua vida (?). Por vezes as marcas da passagem ficam registadas mesmo nas estações de serviço das auto-estradas, e dá a sensação de que estamos diante de algo já consagrado, como se a sociedade fosse cabalmente ou impotente diante de suas acções ou então já fazem parte da vida social...(?)
3. Há dias, ainda muito tempo antes do clássico Sporting – Benfica os jornais registaram entre adeptos rivais violências e mesmo esfaqueamentos; este domingo, a Pública (02.03.2008) dedica uma boa parte das suas páginas ao líder da maior claque do FC Porto «Fernando Madrinha: estranha popularidade». Destacava mesmo: o líder «para alguns, é um susto. Para outros, é o maior, um ícone. Esta é a sua história, a história de alguém que soube potenciar o “mau” e aprendeu a revertê-lo a seu favor.» (Pública, id). Confessam alguns que ele é quase um pastor (liderando os mais de dois mil super dragões em Alvalade), que «investiu no desvio, mas em vez de cair na marginalidade ganhou um lugar na sociedade». Os próprios clubes, instituições do futebol e autoridades não sabem como proceder. Tudo preocupante demais para se ficar sereno diante da ténue fronteira das liberdades… E ainda se poderá perguntar o quanto de impacto têm as claques como “deseducação social”(?). Já não é fácil (e pelo rumo que vai por essa Europa fora), mas como actuar enquanto há algum tempo? Aliás, ainda iremos a tempo de alguma coisa? AC[02.3.8]

Na Linha Da Utopia


O apagão mundial de 29 Fev. 2008
1. Já de há algum tempo a esta parte tem circulado nos diversos canais de comunicação e na internet a mensagem do “apagão mundial”. Não sabemos quem é a origem específica desta ideia que, ao que parece, percorre o mundo, mas provirá de linhas de reflexão e actuação da ordem ecológica. O dia escolhido é o último de Fevereiro, a hora que nos cabe é das 19.55h às 20.00h. Nestes mesmos 5 minutos o mundo pensará na mesma mensagem, para o planeta “respirar”. Apesar, naturalmente, de muita indiferença do pragmatismo das sociedades que não vêm resultado prático destas coisas estando sempre à espera dos resultados imediatistas, o certo é que procura-se (e espera-se) uma resposta massiva, a fim de estudar e ver o que acontece em termos da «brutal» poupança energética.
2. Este apelo, usando a força da união mundial pela Internet, apresenta mesmo um comunicado em várias línguas. Não só na lusofonia ou no inglês do ocidente mas em línguas orientais, árabes e asiáticas. Trata-se, efectivamente, de uma corrente global, do que chamaríamos um despertar da sociedade planetária e suas opiniões públicas para as defesas e preservações fundamentais. Já não é novo este recurso comunicacional. Foi usado tanto para a solidariedade mundial em causas como o Tsunami da Ásia ou os apelos prementes à não execução de pessoas em determinados pontos do globo. Mas, verdade se diga, ao que parece, nunca como neste “apagão mundial” (como estudo e sensibilização de poupança energética) a mensagem chegou tão longe, no apelo ao desligar de todos os instrumentos possíveis a fim de nos encontrarmos “despidos” de todos os aparelhos alimentados de energia.
3. Também neste apelo a deixar “respirar” o mundo (em que poluímos, segundo estudiosos, mais em 30 anos que nos últimos 30 séculos), brota o convite a parar um pouco, a deixar respirar e sentir a vida, esta às vezes tão carregada das corridas ou das coisas instrumentais. A mensagem vai a ponto de dizer em todas as línguas: «Sim, estaremos 5 minutos às escuras, podemos acender uma vela e simplesmente ficar a olhar para ela, estaremos a respirar nós e o planeta». Procuraremos, também, “parar” nesse momento, mesmo à luz da vela... Fazer a pausa do exercício de cidadania planetária nesta mega e humanizante sensibilização. No dia seguinte estarão aí os números da participação e mesmo da poupança energética desses 5 minutos. Também desta forma vamos sentindo que pertencemos ao mundo que aguarda a preservação de todos. Claro, não se esperem resultados que esta experiência não pretende nem pode dar. Mas ela também oferece um sinal daquilo que é a identidade global na defesa de ca(u)sas de todos! Alexandre Cruz [28.02.08]

Na Linha Da Utopia


Os professores, a rua, a educação
1. Já se sabe que esta conjugação (os professores, a rua, a educação) não dá grandes frutos. Os essenciais destinatários, os alunos, cada vez mais cedo descobrem as fragilidades do sistema e usam-no mesmo para atiçarem os educadores que, na sua função absolutamente decisiva na formação deste país, deviam ser preservados, protegidos e apoiados na dignificação do “ser professor”. Claro que os professores não gostam de sair à rua, preferem a sala de aulas; mas quando não há mais recurso a “rua” é o lugar de tornar público aquilo que, no fundo, diz respeito a todos. Seja dito, quanto mais em Portugal os professores tiverem de sair à rua em manifestação, mais difícil se torna a sala de aula. Para além dos possíveis sectores de ideias, mesmo de linhas políticas (em que ninguém se coloca de fora da necessária “avaliação” como estímulo à qualidade), a verdade é que a “rua” acaba, em área tão sensível e estruturante como a educação, por representar o beco sem saída das mesas de reflexão, onde a distância das tutelas à realidade torna impossível a construção razoável do consenso.
2. No passado dia 26 de Fevereiro, à noite, ocorreu mais uma manifestação. Mais de um milhar de professores acorreu percorrendo locais simbólicos em Coimbra. Diversos slogans, ainda que “puxados” como apelo emocionante no meio de tochas, velas e autocolantes, dão o sentir do estado da arte: à frente ia o cartaz «Basta! Assim não se pode ser professor», nas camisolas o lema: «Professores de luto e em luta pela Educação». Este cordão humano junta-se a muitos cordões de insatisfação. Está em causa (talvez) a causa mais importante de todas: a educação. Não se pode ser surdo ao “desabafo” de tantos professores que, não tendo qualquer medo da avaliação (mas contra este modelo tutelar), sentem-se indignificados e quase desacreditados diante das turmas de alunos cada vez mais exigentes, tanto em temos de conhecimentos como de comportamentos. Muitos estudiosos, ao longo de muitos anos, têm dito e redito que não é possível “solucionar” as questões da educação sem os professores, os alunos, os pais, a comunidade.3. Os alunos estão aí, a ver os professores e a tutela na rua do debate público. As famílias, a par da preocupação com a educação dos filhos vivem a super ocupação do pão (que sobe novamente) de cada dia. No ano 22 da Lei de Bases do Sistema Educativo Português, torna-se difícil vislumbrar ainda os elos de ligação de tudo o que envolve o maior tesouro a descobrir: sempre a Educação. É certo, com todas as entidades; mas quanto mais conhecendo e envolvendo as bases mais e melhor lá iremos. O que nunca pode significar permanecer estruturalmente onde se está num mundo em constante mudança. Nesta fronteira de que falamos, até para maior segurança, estabilidade e futuro de todos, o país precisa da redignificação da (autoridade da) função docente. Isto interessa a toda a sociedade civil.
AC [27.2.8]

Na Linha Da Utopia


São cereais, senhor!
1. Nas últimas semanas fomos alertados para a notícia da subida dos preços do trigo nos mercados internacionais. Destes dias, consequentemente, para a constatação alarmante de que será difícil garantir os programas de cooperação alimentar da ONU para com os povos em vias de desenvolvimento. Segundo Abdolreza Abbassian, de nacionalidade iraniana e que antes de chegar há 18 anos à FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação) trabalhou na OCDE e no FMI, as razões desta quebra e do pânico dos mercados são múltiplas e tocam tanto as explicações de crescente concentração económica como os factores psicológicos globais.
2. No dizer desta especialista que esteve recentemente em Lisboa (no congresso do milho), há uma rede de «imprevisibilidade dos inúmeros factores que contribuem para a formação dos preços», o que torna todas as projecções arriscadas, demonstrativo de que «nunca o mercado foi tão volátil e isso vai continuar». Verifica-se a queda das reservas existentes, apesar do aumento de produção, observando-se neste ano 2008 o nível mais baixo de trigo em stock dos últimos 30 anos. Preocupante, no que representa este cereal como primeira fonte alimentícia mundial; simultaneamente desafio à reinvenção dos mecanismos alimentares que garanta o “justo pão”, processo que está em curso.
3. Se é certo que ao leque de razões poderemos acrescentar as questões da hiper-procura das novas potências chinesa e indiana, a par da emergência dos biocombustíveis, todavia, estas razões para a especialista iraniana aparecem como “mitos” que se vão criando, sendo também uma das razões a ter em conta a problemática das questões ambientais. Diante dos cenários de instabilidade global, que agora também chegou aos mercados de cereais, sobre a agricultura portuguesa, enaltece Abdolreza Abbassian as vantagens de ter uma agricultura diversificada, sendo a especialização um risco nestes contextos de incerteza. É verdade a segunda afirmação… Mas não deixa de ser interessante, com várias pistas de reflexão, que quem vem de fora diga que temos agricultura (?) diversificada…
4. Talvez tenhamos, sim, é inúmeras potencialidades nas nossas terras deste lindo país de sol. Mas, na realidade, uma boa parte delas estão à espera do nosso regresso, quando passarmos da tecnocracia, sem medos, para as terras dos chamados, de forma cara, “produtos biológicos”. Até lá, precisamos da redefinição estratégica para um global “milagre dos cereais”!
Alexandre Cruz [26.02.08]

Na Linha Da Utopia


Ao pós-crítica
1. A ideia central, e muito sublinhada, era «um mau-estar difuso», que «alastra e mina a confiança essencial à coesão nacional», podendo-se chegar a «uma crise social de contornos difíceis de prever». Esta foi a linha de pensamento do alerta lançado na semana passada pela Associação para o Desenvolvimento Económico e Social (SEDES). No documento são focados sectores frágeis como a degradação da confiança política, os sinais de crise nos valores, na comunicação social e na justiça, a criminalidade e a insegurança. Este documento deu azo aos comentários mais variados. Na generalidade, carregaram muito mais no pessimismo que continuamente nos derrota que esboçam uma leitura em ordem ao compromisso social de todos na busca das soluções comuns.
2. Naturalmente, todos, pessoas e / ou entidades têm o direito / dever de expressar publicamente como cidadania o seu contentamento ou descontentamento diante da realidade social. O país tem recebido alertas de diversas ordens de pensamento e de diferentes formas de ver e viver a vida em sociedade e as suas crises (neste aspecto lembre-se há anos o fundamentado documento: Nota Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa - “Crise de sociedade, crise de civilização”, 2001). São muitos os pareceres, mas normalmente os que mais sofrem a “crise” vivem-na no silêncio e na luta diária, vendo à noite nas notícias outros que não a vivem, sempre estética e comodamente instalados, a falar dela continuamente. Talvez nestes discursos todos exista um contraditório e um alarmismo mediático que acaba por tocar o “deixa andar”, como se não tivesse sempre dependido e dependesse de todos as soluções (do rigor aos valores humanos e sociais) para os problemas a resolver. Afinal, não são os cidadãos que votam, elegem, levantam, mantêm ou derrubam…?
3. Volta e meia vêm estes alertas. Mas seja dito que eles têm crescido, na proporção do crescimento das desigualdades da sociedade portuguesa. Todavia, não chega só constatar o que vai mal, o carregar nos medos de existir… Na realidade, uma mentalidade pró-activa e dinâmica talvez ofereça a capacidade de criar mais soluções. Depois da crítica de quem muitas vezes vive bem acima da média será preciso passar ao “pós-crítica” e mesmo a uma ordem de justiça redistributiva que se diz não existir. É claro que neste “pós-crítica” estarão os dinamismos situados a cada circunstância. Talvez o eixo esteja na concepção que temos de “política”. No geral, pouco ligamos a não ser na hora de não concordar ou desconfiar. Ainda não descobrimos que todo o cidadão todos os dias é político. Ainda deixamos tudo andar, até… De certeza que com uma cultura activa e mais participativa de todos os cidadãos hoje estaríamos, pelo menos, um pouco mais acima…
Alexandre Cruz [25.02.08]

Na Linha Da Utopia


Património de Aveiro no Moliceiro

1. (Aceitámos o repto lançado...) Há breves dias ocorreu mais uma oportuníssima tertúlia promovida pela Associação dos Antigos Alunos da Universidade de Aveiro (www.aaaua.ua.pt), entidade atenta na dinâmica da mobilização nas mais variadas áreas de iniciativa, sempre aberta à comunidade em geral tendo como especial referência os antigos alunos da academia aveirense. O local destas iniciativas de periodicidade (sensivelmente) mensal é o Hotel Moliceiro. Um espaço ex-libris da cidade que, numa visão de “hotel como cultura”, acolhe esta habitual linha programática de reflexão e debate sobre assuntos que dizem respeito a todos os cidadãos, quer da cidade e região quer da “aldeia” do mundo actual. Desta vez o tema era «o património aveirense»; e que melhor local para o acolher que um (Hotel) Moliceiro!...
2. Sempre que esta reflexão vem à ribalta juntam-se muitas vozes de zelo cuidadoso a par dos sentimentos de ansiedade sobre o que vai ficando por cuidar. Passado, presente e futuro entrecruzam-se neste reconhecimento admirável aos que “deram a vida” (e em que lutas!) por um património aveirense mais preservado e amado. Mas também se reconhece a continuada carência de elos de ligação potenciadores de uma comunidade que viva, conheça, estude, aprecie e se identifique com o seu património cultural. Dos canais (sempre adiados) da Ria de Aveiro, aos canais das comunicações articuladas e programáticas entre todos os “agentes” ainda paira “ruído” no ar, não chegando um cómodo dizer-se que “estamos disponíveis” como se o futuro se fizesse de uma simples “boa vontade” sem o agarrar determinado dos processos de forma concreta, parceira e objectiva.
3. Até quando as causas do património terão de ser uma “luta”? Não corresponderá ele ao que de melhor temos para viver com qualidade e partilhar com quem nos visita? A história dos que edificaram no tempo entidades como a ADERAV (Associação para o Estudo e Defesa do Património Natural e Cultural da Região de Aveiro: www.aderav.com.sapo.pt) mostra-nos que a determinação do “agarrar” a causa salvou Aveiro de “cegueiras” contra o património. Os esforços contemporâneos também são muitos. Alguns, seja sublinhado, como a Rota da Luz, surgem mesmo como plataforma de visibilidade nunca vista para Aveiro. Mas, cá dentro, numa mesma “mesa”, a “rede” poderá despertar as 1001 potencialidades… O primeiro passo é sempre o querer, valorizando o essencial que une a região e suas gentes. Embarcar num mesmo “moliceiro visionário” pode multiplicar caminhos e rentabilizar estratégias. Ninguém que pense a cultura, que “tenha” património e que ame a região pode ficar de fora (do que é público, da sociedade civil ao religioso ou privado). E podem uns ovos-moles ajudar a criar pontes!...
4. Agora só pessoalmente: das coisas que lançam grande interpelação é o facto de em Portugal existirem muitas redes de turismo espanholas a organizar os nossos roteiros do património regional / nacional… Sem palavras, pena. Claro, a nossa menor visão ou o desentendimento são (lhes) um presente caído do céu! (E depois, em Portugal, falta-nos a auto-estima!...) Alexandre Cruz [24.02.08]

Na Linha Da Utopia


Lorosae!
1. Na terra de Timor Lorosae José Ramos-Horta desperta do pesadelo de 11 de Fevereiro. O pó vai acalmando, nem que seja pelo decretar vigilante do “estado de emergência” do governo timorense, agora solicitado como prolongamento para mais 30 dias. A mulher de Xanana Gusmão foi com os filhos agradecer à GNR. É confirmado, pela investigação minuciosa da Missão das Nações Unidas no território, se é que dúvidas existissem, que os dois ataques «estavam relacionados, foram feitos pelo mesmo grupo». Ramos-Horta, gravemente ferido e resgatado pela GNR, foi evacuado para o vizinho Royal Hospital de Darwin. Xanana conseguiu fugir. O rebelde Alfredo Reinado, líder dos ex-militares revoltosos, foi morto no dia dos acontecimentos. Mas, terá sido morta a raiz de todos os problemas desta jovem nação?
2. É difícil falar de Timor. Se o é para quem lá esteve anos e calcorreou as montanhas, muito mais o é para quem não pisou esse chão do sol nascente. Não é só o problema da distância física, dos milhares de quilómetros que nos separam, é bem mais o lugar que Timor ocupa no coração dos portugueses. Por muitas razões da história passada e pelas contínuas pontes de todos os dias com Timor, terra independente desde 2002. Talvez, como se diz, seja mesmo necessário colocar “o coração ao largo” para ver com olhos de ver o que acontece. Timor é (mesmo) dos timorenses. Será que todos os timorenses já se aperceberam disto no esforçado trabalho a realizar todos os dias? Todas as solidariedades não podem substituir todas as responsabilidades. Aliando-se a cooperação do “ensinar a pescar”, será mesmo necessário voltar a pergunta (na teoria, que seja) para o povo de Timor: “Que querem os timorenses de Timor?” (É fácil escrever esta questão, e sabemos do seu simplismo de quem está deste lado do mundo… Mas, por que lado envolver e comprometer?!)
3. Após a independência, como depois de todas as independências seja de que género for, os anos seguintes são decisivos. É o tempo da consolidação e da estruturação das instituições participativas e democráticas. Em Abril-Junho de 2006 ocorreu uma enorme vaga de violência, verificando-se o aprofundar de incompatibilidades de grupos que pensam de forma diferente sobre vários assuntos. Estes ataques de Fevereiro de 2008, diante de problemas sociais em que todas as instâncias e cidadãos têm de ser parte das soluções de forma democrática, acabam por demonstrar que o objectivo era derrubar os poderes presidenciais e governativos… Nestas conjunturas, e diante do incerto futuro, “ter pena” de Timor também não ajuda nada (pelo contrário é não aceitar corajosamente que Timor é dos timorenses). Talvez, simbolicamente, nesta “entrega de Timor aos cidadãos de Timor”, na busca de soluções (sem ociosidade e) pelo trabalho concreto de todos os dias possa residir uma chave do futuro. Mas, o que é SER cidadão e TER o poder em Timor?
4. Custa a compreender, pese embora todas as naturais formas diferentes de pensar sobre isto ou aquilo, que já quase tenha sido perdida a memória colectiva como coesão das lutas pela independência. Ou esta terá sido mais pela emoção e nem tanto com a razão e o compromisso de todos?! Muitos timorenses estão em Portugal nas suas formações pessoais e profissionais. Diante da apreensão do necessário regresso irá também na bagagem a confiança para construir um país Timor onde o sol da paz e do desenvolvimento brilhem cada dia. (Quanto a nós, sabemos que tudo o que dissemos não é nada comparado com a complexa realidade a trans-formar…)
Alexandre Cruz [21.02.08]