...Vivemos um mundo complexo, consciência que ganha relevo à medida em que desvanecem desejadas inocências. Não há maneira de o evitar: é preciso olho vivo em cima de pé ligeiro. É necessário saber ler a realidade, tarefa nada fácil!
...A vida ela própria é um livro. As suas páginas mais intrincadas, por vezes de difícil ou angustiante leitura, que vão fazendo estremecer as certezas que sempre procurámos construir como base mínima da nossa sanidade pessoal e social, devemos reequacioná-las como problemas a resolver: desafios. Nada de desistências a favor da maré, por mais árduo que isso seja, por mais tentação que o comodismo possa trazer-nos. Já nem vou falar daquela ideia juvenil de querer mudar o Mundo, apesar de ter de confessar que me desagrada ver que cada vez mais se considera tal ingenuidade uma fraqueza de espírito. Adiante.
...Como alguns vaticinaram e outros desejaram, o fim da história não existe. Mais: depois das duas grandes guerras, apesar da guerra fria, as coisas pareciam mais simples, nessa realidade bi-polar. A velha Europa, trilhando o seu caminho entre os dois blocos, organizava-se como espaço de prosperidade e de paz – havia uma ideia mobilizadora, protagonizada por grandes Homens. A ONU ganhava forma como ideal de defesa dos Direitos Humanos e garante de uma Ordem Internacional. As coisas só podiam melhorar e, de certa forma, é claro, melhoraram. Há mais países em democracia, há mais vigilância sobre os Direitos Humanos, mais consciência dos problemas, estejam eles relacionados com a guerra, a fome, atentados ambientais ou o terrorismo. Porém, temos motivos de sobra para estarmos preocupados com o futuro e nos mantermos vigilantes. Mais do que isso: actuantes.
...O mundo provou ser mais complexo, e até perverso, do que imaginaríamos ou desejaríamos, sim, e nessa penumbra, enfrentamos, com o passar dos anos, a dura realidade do limite das nossas capacidades para vencer temível torrente. Há contudo uma réstia de luz que, por fortuna, permanece desenhando o horizonte: os Homens são também capazes de obras maravilhosas e, quando unidos na vontade, no esforço, nos princípios, na solidariedade e no respeito mútuo, podem mesmo mudar o Mundo, nem que seja, lentamente, alguns milímetros para melhor. Não é sequer necessária a apologia extremista de um Mundo asséptico, imposto por iluminados – ao gosto de tantos –, mas apenas e só de uma vida mais equilibrada, melhor para todos.
...Acredito que estamos numa posição de partida melhor do que alguma vez estivemos. Vivemos numa aldeia global, numa sociedade de informação, onde tudo se sabe, ou quase tudo (eu sei). Esse mundo entra-nos pela casa dentro e generalizam-se, abrindo telejornais, as suas imagens mais sombrias. Isso pode levar-nos a formar, distraidamente, uma perigosa Cortina de Indiferença. É a fome em África, na Ásia, na América Latina – somando-se desastres naturais –, o que se passa no Darfur e em muitos mais lugares, os Direitos Humanos espezinhados todos os dias por todo o lado, a falência da educação e da política, a corrupção, a crescente escravidão humana, racismo, intolerância. Para uns tudo se resume, confortavelmente, ao “eixo do mal”, para outros ao “mal americano” e aos judeus. Há sempre um inimigo ideológico, um planeta a preto e branco – errado!
...É um novelo intrincado esta nossa Terra, parecendo exasperante, mesmo impossível a descoberta das pontas que permitam domá-lo. Um velhote enigmático (e sábio) que conheci há muitos anos disse-me que as pontas desse novelo se encontram uma dentro de cada um de nós e a outra na nossa própria Rua! E terminou dizendo que era preciso percorrê-la descalço, com menos vaidade, em silêncio, escutando, estendendo as mãos.
...Como o Diário de Aveiro teve a amabilidade – e corre o risco – de me emprestar este espaço, eu junto ao ensinamento do ancião a obrigatoriedade de fazermos ouvir a nossa voz.
Nota: Esta crónica será semanal e tematicamente livre. Falará de política(s), livros, arte, blogues e sentimentos. Terá em grande atenção o espaço da lusofonia, que me é muito querido, Será publicada também num blogue com o mesmo nome (http://cartassakhalin.blogspot.com/), lugar mais vasto para as opiniões do autor. Toma o nome de Cartas para Sakhalin porque é o local mais longínquo que conheço – para lá da Sibéria – onde sei que serão lidas.
...A vida ela própria é um livro. As suas páginas mais intrincadas, por vezes de difícil ou angustiante leitura, que vão fazendo estremecer as certezas que sempre procurámos construir como base mínima da nossa sanidade pessoal e social, devemos reequacioná-las como problemas a resolver: desafios. Nada de desistências a favor da maré, por mais árduo que isso seja, por mais tentação que o comodismo possa trazer-nos. Já nem vou falar daquela ideia juvenil de querer mudar o Mundo, apesar de ter de confessar que me desagrada ver que cada vez mais se considera tal ingenuidade uma fraqueza de espírito. Adiante.
...Como alguns vaticinaram e outros desejaram, o fim da história não existe. Mais: depois das duas grandes guerras, apesar da guerra fria, as coisas pareciam mais simples, nessa realidade bi-polar. A velha Europa, trilhando o seu caminho entre os dois blocos, organizava-se como espaço de prosperidade e de paz – havia uma ideia mobilizadora, protagonizada por grandes Homens. A ONU ganhava forma como ideal de defesa dos Direitos Humanos e garante de uma Ordem Internacional. As coisas só podiam melhorar e, de certa forma, é claro, melhoraram. Há mais países em democracia, há mais vigilância sobre os Direitos Humanos, mais consciência dos problemas, estejam eles relacionados com a guerra, a fome, atentados ambientais ou o terrorismo. Porém, temos motivos de sobra para estarmos preocupados com o futuro e nos mantermos vigilantes. Mais do que isso: actuantes.
...O mundo provou ser mais complexo, e até perverso, do que imaginaríamos ou desejaríamos, sim, e nessa penumbra, enfrentamos, com o passar dos anos, a dura realidade do limite das nossas capacidades para vencer temível torrente. Há contudo uma réstia de luz que, por fortuna, permanece desenhando o horizonte: os Homens são também capazes de obras maravilhosas e, quando unidos na vontade, no esforço, nos princípios, na solidariedade e no respeito mútuo, podem mesmo mudar o Mundo, nem que seja, lentamente, alguns milímetros para melhor. Não é sequer necessária a apologia extremista de um Mundo asséptico, imposto por iluminados – ao gosto de tantos –, mas apenas e só de uma vida mais equilibrada, melhor para todos.
...Acredito que estamos numa posição de partida melhor do que alguma vez estivemos. Vivemos numa aldeia global, numa sociedade de informação, onde tudo se sabe, ou quase tudo (eu sei). Esse mundo entra-nos pela casa dentro e generalizam-se, abrindo telejornais, as suas imagens mais sombrias. Isso pode levar-nos a formar, distraidamente, uma perigosa Cortina de Indiferença. É a fome em África, na Ásia, na América Latina – somando-se desastres naturais –, o que se passa no Darfur e em muitos mais lugares, os Direitos Humanos espezinhados todos os dias por todo o lado, a falência da educação e da política, a corrupção, a crescente escravidão humana, racismo, intolerância. Para uns tudo se resume, confortavelmente, ao “eixo do mal”, para outros ao “mal americano” e aos judeus. Há sempre um inimigo ideológico, um planeta a preto e branco – errado!
...É um novelo intrincado esta nossa Terra, parecendo exasperante, mesmo impossível a descoberta das pontas que permitam domá-lo. Um velhote enigmático (e sábio) que conheci há muitos anos disse-me que as pontas desse novelo se encontram uma dentro de cada um de nós e a outra na nossa própria Rua! E terminou dizendo que era preciso percorrê-la descalço, com menos vaidade, em silêncio, escutando, estendendo as mãos.
...Como o Diário de Aveiro teve a amabilidade – e corre o risco – de me emprestar este espaço, eu junto ao ensinamento do ancião a obrigatoriedade de fazermos ouvir a nossa voz.
Nota: Esta crónica será semanal e tematicamente livre. Falará de política(s), livros, arte, blogues e sentimentos. Terá em grande atenção o espaço da lusofonia, que me é muito querido, Será publicada também num blogue com o mesmo nome (http://cartassakhalin.blogspot.com/), lugar mais vasto para as opiniões do autor. Toma o nome de Cartas para Sakhalin porque é o local mais longínquo que conheço – para lá da Sibéria – onde sei que serão lidas.
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