15 de abril de 2008

Esplendor de Portugal


Público
segunda-feira, 7 de Abril de 2008
Na lista negra

Há empresas que são aconselhadas a mudar gestores, se querem partilhar os chorudos negócios que se fazem com o Estado
António Borges é um economista de renome e com uma carreira imaculada no sector privado. Considera-se, há muito tempo, uma reserva da nação. É apontado, ciclicamente, como uma alternativa à liderança do partido e candidato a primeiro-ministro, pelos notáveis do PSD. Não sei se está talhado para esses voos porque, apesar de as suas opiniões sobre a economia serem respeitadas, não conseguiu ainda que os seus correligionários e o eleitorado conheçam o seu pensamento político.
Pelo âmbito das suas intervenções, vejo-o antes como um futuro candidato a ministro das Finanças. Poderia ser, aliás, uma excelente escolha para governador do Banco de Portugal, o que ajudaria a prestigiar e desgovernamentalizar uma instituição que está transformada numa irrelevância. Vão longe os tempos dos governos PSD/CDS, em que o seu governador era elogiado pela sua "independência" que, afinal, e a julgar pela forma como apoia o actual Governo, mais não era do que uma forma encapotada de antagonismo. Constâncio tem sido, aliás, tão acrítico que chega a ser mais papista que o Papa, como aconteceu com as suas recentes declarações sobre o IVA.
Mas, na sua última entrevista, António Borges levantou uma questão política que transcende os seus temas predilectos. Falou, desta vez, do clientelismo e queixou-se que a instituição bancária para que trabalha estará na "lista negra", pelo facto de ele não se ter vergado às pressões do Governo. Ora, esta é uma acusação grave, tanto mais que Borges nunca a faria sem obter a autorização prévia dos seus patrões para quebrar um sigilo que, por norma, se aplica às instituições bancárias e, em particular, no que diz respeito à sua relação com o poder político.
Conhecem-se os "casos Charrua", na função pública, em que o delito de opinião é punido. Pela inversa, pressente-se, por exemplo no caso de Constâncio, que a sua subserviência o ajudou a sobreviver à acusação de negligência, no caso BCP. No entanto, a questão das listas negras tem sido abafada, apesar de ser algo que este Governo, ou pelo menos alguns dos seus membros, tem manipulado de forma pouco sensata.
Sabe-se que há empresas que são aconselhadas a mudar gestores, se querem partilhar os chorudos negócios que se fazem com o Estado e as empresas da sua órbita. Ouve-se que há projectos que soçobram porque os seus autores não são "de confiança". Há pessoas que são proscritas, por força dessas pressões. Há gente que cai em desgraça, por estar do lado errado do espectro político ou apenas por ter criado, pelo uso legítimo da sua liberdade de opinião ou de associação, alguma dificuldade a um qualquer ministério. Por norma, não se fala disso, tanto mais que as vítimas receiam que a denúncia só agrave e prolongue o seu ostracismo. Por isso, e mesmo que se possa pensar que o prejuízo que o seu banco tem vindo a sofrer é o preço a pagar pela alternância e contrasta com os benefícios que já terá colhido quando ele era (e porque ele era) "da situação", Borges pode ter prestado, desta vez, o seu maior serviço ao país e à nossa liberdade que, tantas vezes, sentimos amordaçada.
Rui Moreira, Presidente da Associação Comercial do Porto

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