Triste sentença
Nos últimos dias veio outra vez à baila o tema da Casa Pia de Lisboa. Uma entrevista de Catalina Pestana, ex-provedora, reacendeu, em termos mediáticos, o problema grave dos eventuais abusos sexuais sobre algumas das crianças à guarda daquela instituição.
Independentemente das críticas que podemos fazer a Catalina Pestana, nomeadamente perguntar-lhe o que fez para acabar com as práticas que diz ininterruptas, ela trouxe para a ribalta uma preocupação que nos afecta a todos.
Não só nos deixa consternados o facto de a pedofilia subsistir sobre aquelas infelizes crianças, mas também não sabermos em que pé anda a justiça relativa ao caso investigado. Afinal, o que se passou? O que se passa?
Se perguntarem a qualquer português o que acha que vai acontecer com o caso Casa Pia, qual acham que será a resposta? Sabemos que quase todas as pessoas consideram que não se fará justiça. O que significa isto?
A expressão mais ouvida em Portugal quanto aos casos mediáticos de suspeita de crimes graves que envolvam gente importante, com dinheiro ou poder – creio que a excepção que confirma a regra terá sido Vale e Azevedo, antigo presidente do Benfica – é aquela que diz que «tudo ficará em águas de bacalhau». Será maledicência pura ou espelho da realidade?
Os casos em que, através de expedientes jurídico-administrativos vários, famosos gabinetes de advogados tornam “inocentes” uns e outros, por cansaço, prescrição ou magia, são muitos e escandalosamente evidentes. É que não se trata de provar a sua inocência, mas antes enviar para as calendas gregas ou parte incerta qualquer sucedâneo da investigação, também ela, em muitos casos, ferida de morte.
Por outro lado, também é preciso denunciar a vergonha que é o julgamento em praça pública (nos média) a que tantos são sujeitos, sem a possibilidade de ver limpo o seu nome, enlameado pelo voraz apetite da pobreza espiritual, alimentado por uma comunicação social que não se percebe a que amo serve. Uma mistela de coisas que nos envergonham enquanto Estado supostamente democrático.
Preocupa-me sobretudo, devo dizê-lo, aqueles que não têm acesso a chorudas contas bancárias e aos respectivos gabinetes de advogados, ou que, sendo pequeninos, não chegam com a boca ao faústo repasto da corrupção.
Basta ver a promiscuidade entre políticos, clubes de futebol – não queria bater no ceguinho, mas não tenho como fugir –, juízes, autarquias, empresas de construção, entre outros. Até na minha pequena terra de origem as coisas são assim, exuberantes, para escárnio dos pobres, cujo único ganho é rir, rir de tanta loucura.
Não tenho a veleidade de querer propor uma cura milagrosa para tanta podridão. Não gosto de demagogia. O problema é complexo e precisa de todos.
Sei apenas que a justiça tem de se basear numa lei forte, simples, sólida sobre os criminosos e protectora dos inocentes, numa lei que esteja acima de todos e que sirva a todos. Mas não basta, pois é preciso um sistema e pessoas que a façam aplicar, sem contemplações. Esse sistema não existe em Portugal – não tapemos o sol com a peneira.
A justiça começa também em cada um de nós, nos nossos actos, naturalmente – que isto não vai apenas de pregar –, mas igualmente na capacidade de a reclamarmos, nas coisas de todos os dias, sem medo. Começa numa sociedade civil forte, capaz de se organizar e unir para contrabalançar poderes.
A opinião geral é de que a justiça está enclausurada nos tribunais, quais palacetes bolorentos no alto do Olimpo de onde soa o roar dos trovões para a populaça. Está certamente enclausurada na letra da lei, essa lei portuguesa “tão avançada”, eufemismo poético, habilmente articulado, que mais parece tecido para apanhar pequenas moscas e deixar escapar grandes moscardos.
O sentimento de impunidade e de incapacidade de fazer valer os nossos direitos mínimos é avassalador e triste. É como quando nos vendem um produto com defeito e pedimos justiça. O nosso interlocutor encolhe os ombros, diz-nos que não pode fazer nada e que teremos de falar com o gerente, esse mítico D. Sebastião. O problema é que, na maior parte das vezes, o gerente tarda em aparecer, ou há ainda outro gerente acima do gerente, e desistimos, cansados, descrentes.
O povo diz que não adianta, que não há nada a fazer. Quem terá ditado esta condenação?
Independentemente das críticas que podemos fazer a Catalina Pestana, nomeadamente perguntar-lhe o que fez para acabar com as práticas que diz ininterruptas, ela trouxe para a ribalta uma preocupação que nos afecta a todos.
Não só nos deixa consternados o facto de a pedofilia subsistir sobre aquelas infelizes crianças, mas também não sabermos em que pé anda a justiça relativa ao caso investigado. Afinal, o que se passou? O que se passa?
Se perguntarem a qualquer português o que acha que vai acontecer com o caso Casa Pia, qual acham que será a resposta? Sabemos que quase todas as pessoas consideram que não se fará justiça. O que significa isto?
A expressão mais ouvida em Portugal quanto aos casos mediáticos de suspeita de crimes graves que envolvam gente importante, com dinheiro ou poder – creio que a excepção que confirma a regra terá sido Vale e Azevedo, antigo presidente do Benfica – é aquela que diz que «tudo ficará em águas de bacalhau». Será maledicência pura ou espelho da realidade?
Os casos em que, através de expedientes jurídico-administrativos vários, famosos gabinetes de advogados tornam “inocentes” uns e outros, por cansaço, prescrição ou magia, são muitos e escandalosamente evidentes. É que não se trata de provar a sua inocência, mas antes enviar para as calendas gregas ou parte incerta qualquer sucedâneo da investigação, também ela, em muitos casos, ferida de morte.
Por outro lado, também é preciso denunciar a vergonha que é o julgamento em praça pública (nos média) a que tantos são sujeitos, sem a possibilidade de ver limpo o seu nome, enlameado pelo voraz apetite da pobreza espiritual, alimentado por uma comunicação social que não se percebe a que amo serve. Uma mistela de coisas que nos envergonham enquanto Estado supostamente democrático.
Preocupa-me sobretudo, devo dizê-lo, aqueles que não têm acesso a chorudas contas bancárias e aos respectivos gabinetes de advogados, ou que, sendo pequeninos, não chegam com a boca ao faústo repasto da corrupção.
Basta ver a promiscuidade entre políticos, clubes de futebol – não queria bater no ceguinho, mas não tenho como fugir –, juízes, autarquias, empresas de construção, entre outros. Até na minha pequena terra de origem as coisas são assim, exuberantes, para escárnio dos pobres, cujo único ganho é rir, rir de tanta loucura.
Não tenho a veleidade de querer propor uma cura milagrosa para tanta podridão. Não gosto de demagogia. O problema é complexo e precisa de todos.
Sei apenas que a justiça tem de se basear numa lei forte, simples, sólida sobre os criminosos e protectora dos inocentes, numa lei que esteja acima de todos e que sirva a todos. Mas não basta, pois é preciso um sistema e pessoas que a façam aplicar, sem contemplações. Esse sistema não existe em Portugal – não tapemos o sol com a peneira.
A justiça começa também em cada um de nós, nos nossos actos, naturalmente – que isto não vai apenas de pregar –, mas igualmente na capacidade de a reclamarmos, nas coisas de todos os dias, sem medo. Começa numa sociedade civil forte, capaz de se organizar e unir para contrabalançar poderes.
A opinião geral é de que a justiça está enclausurada nos tribunais, quais palacetes bolorentos no alto do Olimpo de onde soa o roar dos trovões para a populaça. Está certamente enclausurada na letra da lei, essa lei portuguesa “tão avançada”, eufemismo poético, habilmente articulado, que mais parece tecido para apanhar pequenas moscas e deixar escapar grandes moscardos.
O sentimento de impunidade e de incapacidade de fazer valer os nossos direitos mínimos é avassalador e triste. É como quando nos vendem um produto com defeito e pedimos justiça. O nosso interlocutor encolhe os ombros, diz-nos que não pode fazer nada e que teremos de falar com o gerente, esse mítico D. Sebastião. O problema é que, na maior parte das vezes, o gerente tarda em aparecer, ou há ainda outro gerente acima do gerente, e desistimos, cansados, descrentes.
O povo diz que não adianta, que não há nada a fazer. Quem terá ditado esta condenação?
2 comentários:
http://www.correiomanha.pt/noticia.asp?id=263675&idselect=9&idCanal=9&p=200
http://dn.sapo.pt/2007/10/30/sociedade/provavelmente_nenhum_aluno_chumbou_f.html
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